Dor e clamor por justiça: o impacto da morte de Kelsy Santos no lar da família 2w5y48

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Primeira reportagem da série da Gazeta revela o impacto da perda, o sofrimento da família e os questionamentos sobre a atuação da saúde pública no atendimento a emergências

Por Ricardo Nogueira 

A Gazeta de Bananal inicia hoje uma série de reportagens sobre a morte de Kelsy Tamires dos Santos, de 37 anos, que, segundo sua família, foi vítima de negligência, equipamentos defeituosos e falhas no atendimento prestado pela Unidade Mista de Saúde de Bananal. 

A tragédia, ocorrida no dia 18 de maio, impactou profundamente a cidade e lançou desconfiança sobre o atendimento em saúde no município.

Kelsy vivia com o marido, dois filhos adolescentes e uma filha de apenas dois anos e meio. Sua morte, repentina e carregada de questionamentos, deixou uma dor imensa e abriu feridas que ainda estão longe de cicatrizar.

Um lar em meio a dor e busca por justiça 

Não haveria como iniciar esta série sem descrever o ambiente em que a reportagem foi recebida — a casa da mãe de Kelsy — tomada por um silêncio denso, pela tristeza evidente e pelos reflexos diretos de uma perda tão dolorosa.

A reportagem começa estabelecendo um contraponto necessário a estes tempos em que a superficialidade do "mundo virtual" frequentemente se choca com a realidade dos acontecimentos, diminuindo a sensibilidade das pessoas e a empatia diante da dor alheia. Em meio a julgamentos apressados, narrativas prontas e análises rasas feitas por trás de telas, a perda de uma vida real — com nome, rosto, filhos, história — exige escuta, respeito e profundidade.

É nesse espírito que a Gazeta de Bananal inicia esta série: buscando enxergar o que há por trás da tragédia, sem o filtro de telas, com a responsabilidade de dar voz a quem, em meio à dor, busca justiça e verdade.

Primeiros contatos com a imprensa

A Gazeta de Bananal foi procurada por familiares que buscavam orientação e o contato com uma emissora de TV da região. Eles já haviam se manifestado publicamente nas redes sociais e concedido entrevistas para outros veículos. Abriram as portas de casa para a reportagem da Gazeta na tarde de 22 de maio, quatro dias após a morte de Kelsy.

Rosa iniciou a conversa afirmando que provavelmente não choraria mais — não por falta de sentimento, mas por já ter derramado todas as lágrimas possíveis. Falou com serenidade sobre a dor dos netos, sobretudo da filha mais nova de Kelsy, de apenas dois anos e meio. “Eu tive que dizer pra ela que a mamãe virou uma estrelinha... Ela olhou pra mim e disse que também queria virar uma estrelinha pra ficar perto da mãe. Como a gente lida com isso? Fiquei sem chão”, contou, com um olhar que falava mais do que as palavras. Conforme ela previu, não houve lágrimas durante a entrevista, mas a tristeza era evidente em cada olhar, cada silêncio, cada gesto dos presentes.

A visita da reportagem aconteceu em um momento particularmente delicado. Enquanto a família ainda tentava assimilar a ausência de Kelsy,  foi veiculado o primeiro vídeo do prefeito William Landim da Silva sobre o caso. O pronunciamento do prefeito gerou revolta imediata entre os familiares. Pouco antes da chegada da equipe da Gazeta, a reação de Rosa, num vídeo impactante, reagindo às declarações do atual chefe do Executivo, já havia se espalhado pelo WhatsApp, mostrando ao mesmo tempo desespero e revolta.

Os familiares de Kelsy, como um todo, se mostraram indignados com a insinuação, da "versão oficial", de que eles estavam mentindo sobre os fatos ocorridos. Uma indignação que se estendeu aos amigos e a grande parte da opinião pública.


A conversa com a família também revelou um senso de mobilização. Na manhã daquele mesmo dia, os familiares tinham ido à Promotoria de Justiça da Comarca de Bananal, onde relataram em detalhes os acontecimentos do dia da morte de Kelsy. Descreveram momentos de pânico e desespero ao perceberem que o médico plantonista enfrentava dificuldades técnicas, sem os medicamentos que solicitava e com equipamentos que falhavam na chamada "sala vermelha".

Relembraram a agonia da transferência para Cruzeiro, realizada em uma ambulância que consideram inadequada para o estado crítico de Kelsy, com problema até para fornecer oxigênio para a paciente. Ela chegou com vida em Cruzeiro. A ambulância retornou a Bananal e o marido, que a acompanhou na viagem, se sentiu isolado na sequência do atendimento no hospital de referência. Lá, ele disse ter ouvido desabafos de um médico sobre as condições de quase morte de pacientes vindos de Bananal.

Os familiares também apresentaram à reportagem cópias de exames, laudos e documentos que foram entregues ao Ministério Público. Entre eles, dados que, segundo a família, demonstram a evolução do quadro clínico de Kelsy, desde o início daquela semana, e reforçam a tese de negligência na condução do atendimento hospitalar prestado pela unidade municipal.

Durante a visita, também foi mencionada a manifestação pacífica pelas ruas centrais de Bananal, a ser organizada, no dia seguinte, em homenagem a Kelsy. Mais do que uma despedida, a eata teve o objetivo claro de pedir justiça e garantir que tragédias como essa não voltem a acontecer com outras famílias. “Não queremos que ninguém mais e por essa dor. A Kelsy não volta mais, mas a gente pode tentar evitar que outra mãe, outro pai, outro filho sinta o que estamos sentindo”. Na ocasião, Rosa disse que não pretendia participar, mas mudou de ideia e até se pronunciou, externando sua dor durante a manifestação.

A família também relatou para a reportagem sua desconfiança com relação à comissão designada na Prefeitura para apurar o óbito. Deixaram claro na Promotoria que não confiam em relatórios produzidos por quem está politicamente ligado à atual gestão municipal - ou em cargos de confiança -, e demonstraram ceticismo com a atuação da Câmara Municipal, onde o prefeito conta com ampla maioria. Rosa não detalhou como irá fazer, mas afirmou que, oportunamente, irá exigir posicionamento dos vereadores.

Comentários "políticos" para desqualificar as ações da família 

Para além da dor da perda, os familiares ainda têm lidado com comentários e insinuações de que estariam sendo manipulados ou explorados politicamente, numa tentativa de deslegitimar sua dor e sua luta. “Como se a gente não tivesse personalidade, como se não soubéssemos o que queremos. E o que queremos é justiça e que ninguém mais e por isso”, desabafou Rosa. 

As verdadeiras narrativas políticas são as que tentam silenciar ou desacreditar a dor de uma família que perdeu uma filha, uma mãe, uma companheira, de forma brutal e inesperada.

Nesta série de reportagens, a Gazeta de Bananal vai abordar com profundidade todos os aspectos desse caso, que ultraa a tragédia individual e levanta reflexões urgentes sobre a saúde pública em Bananal. A memória de Kelsy, como disseram seus familiares, precisa ser honrada com ações que tragam verdade, justiça e mudança.

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